As crianças devem ser ensinadas sobre como pensar, não o que pensar. — Margaret Mead A citação supramencionada aponta o principal problema que tem vindo a assumir um papel cada vez mais preponderante na pedagogia de todos os tempos. As crianças são o alvo mais fácil deste género de abordagem educativa, uma vez que a sua ingenuidade e inocência face ao mundo impede-as de reagirem contra o fenómeno da aprendizagem de matriz. No caso dos jovens, não seria assim tão fácil assumir o controlo sobre o seu processo cognitivo, mas os diferentes métodos impeditivos de aquisição de uma aprendizagem imparcial e instigadora de uma reflexão mais inata no que aos estudantes concerne, principalmente atribuídos pelo poder político e governativo, entregam cada vez mais instrumentos repressivos às direcções escolares, públicas mas autónomas nas suas práticas, patentes num regulamento interno, interpretado através de um prisma inegociável com o sujeito primordial que dá uma razão de ser à instituição educativa: o estudante. Sendo menores de idade, os alunos escolarizados até ao final do ensino secundário, de há relativamente poucos anos a esta parte tornado obrigatório e gratuito (portanto isento de propina, apenas), vêem-se inequivocamente reprimidos por todo um conjunto de regras semelhante ao intuito resolutivo do código de processo penal. Significa isto que o objectivo inerente à reclusão de um indivíduo não é nunca a sua reabilitação social, mas sim a sua mera punição. É parte integrante da natureza humana ousar desafiar normas. Quanto maior e mais poderosa for a proibição de violação de um determinado código, maior será então o ímpeto experimentado rumo à anarquia. O conceito de Estado de Direito Democrático, regime do qual múltiplos países em todo o mundo se orgulham de ter implementado após longas e duradouras experiências totalitárias, oferece variadíssimas escolhas ao cidadão comum dos mais diversos domínios e naturezas. No entanto, a possibilidade de opção individual é aquela que parece ser a mais limitada, vislumbrando-se no horizonte um objectivo de disciplina comunitária e social, que por sua vez aponta para a uniformização ilegítima da diferença. Se estivéssemos perante um caso de perigo de corrupção da ordem pública, a Democracia não teria nenhum outro remédio senão intervir e suprimir o movimento anárquico, já por si falacioso. O princípio que serve de base à anarquia é precisamente a ausência de princípios. Um regime democrático compreende já a existência de liberdades individuais. Tem por isso a obrigação de impedir que os desvios pessoais de cada um coloquem em perigo as liberdades dos restantes indivíduos que da mesma sociedade fazem parte ou que pretendem vir a integrar no futuro. Aquilo que é, isso sim, impensável na Democracia, é condicionar a liberdade de pensamento direccionada para o progresso, o que, surpreendentemente, ainda aterroriza o equilíbrio funcional das instituições de soberania nacional. É de recordar que a educação propagandística de uma ditadura pressupõe a lavagem cerebral desde cedo dos seus cidadãos, de forma a sempre mostrarem apoio ao regime, sem qualquer intenção de constituição de oposição que atraia a atenção da comunidade internacional para intervir. A verdade é que, mesmo em Democracia, o insucesso escolar continua a representar uma abominável ameaça ao crescimento global de um Estado nos mais diversos domínios em que está envolvido, e tudo porque a ministração do ensino não é devidamente levada a cabo. Não se trata de defender apenas o leccionamento das matérias que mais interessam a cada estudante. A expressão "cultura geral" não é meramente indicativa. Deve compreender, de facto, uma generalização de conhecimento que seja capaz de munir cada estudante com os instrumentos necessários, tanto à sua utilidade própria, privada, como à utilidade, mais do que social, civilizacional. Foi referido acima que o sujeito principal da instituição educativa é o estudante. Se não existisse necessidade alguma de instrução de cada ser humano em processo de auto-conhecimento, não faria sentido a existência da escola, muito menos de formadores, de professores que antes de assumirem as suas funções foram eles próprios estudantes. O estudante olha para a escola como uma dádiva, uma oferenda que foi transmitida aos seus antepassados, que passa para as suas mãos e que abrangerá no futuro os seus descendentes. E no entanto, é ele quem mais perde no seio do ambiente pedagógico. A postura militarista de um educador, sedento de respeito e reconhecimento da sua autoridade académica, não passam senão de mecanismos de defesa de alguém extremamente inseguro que não é capaz de, muito ao contrário de exigir, merecer o respeito dos seus discípulos, que, sozinhos, reconhecerão a sua linha de pensamento como um exemplo a seguir ou, inversão de enredo, algo a desafiar. Aquilo que muitas vezes justifica a colisão intelectual entre o professor e o estudante é o desprezo revelado pelo primeiro face à reflexão do segundo. Professor significa criador de profissão. Um professor profissionaliza. Quer isto dizer que, a partir do momento em que assume a sua função pública de instrução, compromete-se a irrepreensivelmente instruir o estudante para que este possa executar as suas próprias funções com os maiores rigor e profissionalismo, justamente, possíveis. Acontece que cada estudante, baseado nas suas experiências académica, artística, demográfica, económica, financeira, geográfica, profissional, social, etc., entre tantas outras, detém um espírito crítico. Existem motivações no seu interior que o conduzem à formação de uma opinião própria, que poderá estar, ou em consonância com a do professor, ou em dissonância. E é nesta altura que se dá o choque. Uma das posturas mais aterradoras que o professor se vê capaz de adoptar é colocar o seu orgulho pessoal à frente de uma discussão de ideias que conduza à sustentação de um novo prisma sobre uma qualquer matéria, ainda que estudada desde a Antiguidade. A promoção de conversas e debates nas aulas baseia-se frequentemente numa fachada triste de se ver. As opiniões recém-formadas pelos estudantes a partir do seu espírito crítico devem obrigatoriamente prever a sua similitude para com a opinião do educador. Caso ocorra o contrário, a opinião do estudante tanto pode ser aceite e desprezada, como que varrida para debaixo do tapete, sem que ninguém dê conta, como desprezada logo de início, numa situação em que a insuflação de soberba é claramente visível da parte do moderador. Portanto, aqueles que teriam o poder de alterar o sistema, depois de se transformarem em partes integrantes do mesmo, preferem viciar um pouco mais esse sistema à sua maneira, ou simplesmente aplicar uma vingança passiva de não apresentarem quaisquer objecções ao código que os regeu anteriormente, numa fase em que os próprios foram os instruídos. É por isso que não existe nada mais simples do que a união para travar a corrupção sistemática e viciosa. A massa maior é composta pelos estudantes. São dezenas para um professor só, são centenas para apenas algumas dezenas de educadores. Não é um golpe de estado que aqui se sugere. A espécie humana é a única dotada de razão e que por isso aprende a dialogar, de forma a resolver os problemas que entre si tiverem lugar, evitando assim disparates reaccionários como a ignorância, a impulsividade, a rispidez e a infeliz soberba de quem se faz superior por conta de factores externos completamente irrelevantes como estatuto, experiência, idade ou título académico. Está apenas e só nas mãos do estudante, unido ao seu semelhante e colocando de lado o ridículo da imbecilidade competitiva que habitualmente os separa, desvirtuar o sistema dos seus vícios e exigir o seu tratamento com dignidade e a melhoria dos vários métodos de munição de instrumentos académicos que poderão fazer de si um profissional altamente competente que, acima de qualquer outro aspecto, é capaz de produzir conhecimento científico, não só baseado no seguimento do que outros referiram ao longo da História da Humanidade, mas também na discórdia, desde que didáctica e útil à inovação dos elementos de aprendizagem que o tornarão num cidadão civilizacional responsável e respeitador dos Direitos Universais do Homem e da Mulher, mas com um cérebro apenas submisso ao seu próprio controlo. Tiago Lameiras, PhD
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